Eu comecei a dançar. Faz dois anos. Inicialmente, numa dessas academias de dança, em grupo. Logo percebi que eu precisava de uma personal-dancer para poder atender às minhas necessidades mais específicas. Pois, há seis anos sou portador da Doença de Parkinson. E foi aí que começou de fato a mudar minha vida
A DANÇA DE SALÃO E A FISIOTERAPIA
Há três pilares básicos de resistência à fúria da Doença de Parkinson. O tratamento medicamentoso; a Fisioterapia e o estado mental. A dança é um poderoso recurso para flexibilizar as articulações, e oxigenar a mente.
No início, Adriana, a personal-dancer, usava de todos os seus conhecimentos técnicos que aprendera durante todos os anos de formação em dança. Atenta à coreografia, se continuássemos naquele ritmo, em poucos meses eu já poderia participar do programa do Faustão, "A dança dos não-famosos". Logo ela compreendeu que precisava desenvolver comigo um programa de movimentos que mais se adequassem às minhas necessidades. Assim, ela começou a ler e se aprofundar um pouco sobre o assunto e, aos poucos, foi adaptando a seu desempenho aos exercícios de fisioterapias recomendados. Por ex.: Em vez de caminhar a passos largos numa linha reta, segurando um bastão, para exercitar o equilíbrio, Adriana me conduz, passos sincronizados com os dela, no ritmo de um tango; ou então entra em cena o forró de "Arrasta Pé", que mexe com a cabeça, tronco, quadril e membros.
Os ritmos se alternam, cada um deles mexe mais com determinada parte do corpo. E há que se ter postura pra dançar. "levanta os ombros, não olhe para o chão, umbigo nas costas. Respire e solte o ar devagar.” são alguns comandos que recebo quando estou dançando. No meu caso, a atenção a esses detalhes é maior porque a rigidez da musculatura envolvida na respiração reduz a eficiência respiratória no portador de Parkinson e compromete os movimentos e a regularidade dos ciclos respiratórios, dificultando a inspiração o que também compromete a qualidade e intensidade da voz!
Passamos, às vezes, do samba de gafieira ao bolero, de acordo com o meu momento.
Cada ritmo mexe não só com o corpo, mas com um determinado sentimento. E essa é a parte mais importante.
A DANÇA COMO TERAPIA PARA A MENTE
Obviamente, a dança não conserta os neurônios defeituosos que causam a doença degenerativa, porém, embalada pela música, ela vence os seus sintomas ao transportar o cérebro para um nível de interação acima do normal.
Os benefícios da dança como uma atividade física são bem conhecidos: melhora do condicionamento aeróbico, aprimoramento da coordenação motora, flexibilidade, perda de peso, entre tantos outros.
Mas pouco se fala da dança como uma terapia, os seus benefícios para a mente. Basta observar com um pouco mais de atenção para perceber que os resultados vão muito além do bem-estar físico.
Bem estar mental, auto-estima elevada, combate à depressão, de bem com a vida, não importam as dificuldades do dia-a-dia são apenas algumas das transformações que se nota em quem se arrisca a adentrar o mágico mundo da dança.
Mais do que técnica, é preciso sentimento. Isso me ajudou na mudança de vida a que me referi.
Desde que fui seduzido pela dança, senti melhora da minha auto-estima, passei a gostar mais de mim e, até achar graça de quem acha que a vida é coisa de gente séria. A melhor estratégia nessa batalha é se livrar das tensões, cercar-se pessoas que você gosta e fazer as coisas que dão prazer. A dança requer serenidade, bom humor, entrega.
Portanto, abaixo a depressão, fora o mau humor, pois a vida não é só problemas. Vou brincar e vou dançar sem medo de ser feliz. Como dizia minha mãe, em sua sabedoria: "Na vida, nem tudo são flores" é verdade, mas nem tudo, também são espinhos. Penso que este é o espírito de quem colocou a dança em sua vida.
É uma benção para mim, saber que um dos recursos que disponho para domar uma doença que não tem cura é a dança, sem dúvida a mais prazerosa das terapias.